Tensegridade
Assim como a resiliência, emprestada de um conceito da física sobre propriedades de objetos, a tensegridade é um conceito emprestado da mecânica.
Tensegridade é a propriedade de objetos que usam tração e compressão de forma combinada para proporcionar estabilidade e resistência, como uma ponte estaiada, por exemplo.
Em biomecânica, os animais e estruturas biológicas usam tração e compressão para criar resistência. Músculos e ossos trabalham simultaneamente para se fortalecerem.
Assim como a estrutura atômica se repete em escala maior nas células do corpo e no formato do universo, este gênero de resistência aparece como uma nova explicação para estruturas biológicas, pois se repete no nível das células.
Compressão e tração, movimentos contínuos e descontínuos, integram-se mantendo a estabilidade da estrutura.
Metaforicamente, são dois lados de uma moeda, e ao contrário do que se pensava anteriormente, não são opostos, mas complementares. São movimentos que se solidarizam dentro das estruturas.
É uma união entre os contrários. Como em vários sistemas físicos, é a repulsa e a atração.
Em nosso corpo podemos facilmente descrever algumas tensegridades: a integração músculo-osso, enquanto músculo é a tração e osso a compressão, o contínuo e descontínuo. E o sistema nervoso, em que neurônios motores e neurônios sensitivos se complementam.
Distanciando-nos da dicotomia da ciência ocidental, em que dividimos mente e corpo, e voltando-nos para uma noção fenomenológica do humano em que mente-corpo-emoções são ser, em que ser é presença, os opostos em nós coexistem, se complementando.
Unindo corpo e emoções como faces da mesma moeda, como um só, nesse contínuo-descontínuo e em movimentos de puxar-empurrar, trabalhamos a consciência corporal por caminhos estruturais.
Em nosso cotidiano nos deparamos com situações que nos colocam em tração-compressão a todo o momento.
A vida nos questiona, o exterior nos pressiona a tomar decisões, o mundo nos convoca para “empurrarmos” ou “puxarmos”, desde grandes decisões até micro decisões como levantar da cama pela manhã.
São dilemas, um campo de diferentes sobreposições de potenciais de ações (ou não-ações) que evocam imediatamente seus opostos.
A ideia é que a tensão não é patológica a um sistema, mas constitutiva da identidade, estabilidade e integridade.
O desenvolvimento pode ser conceituado como uma forma de tensegridade entre continuidade e descontinuidade. O presente é uma tensão-compressão do passado e do futuro, ao mesmo tempo em que o dilema faz parte do experienciar da vida.
Assim, podemos pensar a vida como um processo de tensegridade dinâmica, entre organismo e ambiente e que se retroalimenta, ao invés de pensarmos nela com uma sequência de estados de equilíbrio e crises, o que nos é comum.
Merleau-Ponty nos falava de um corpo próprio e um corpo objeto. O segundo sendo aquele que tem seus movimentos imitados do exterior, que cede à pressão e colapsa.
Com um movimento imitado e “desconjuntado”, nos leva a pensar em pessoas “superficiais”, que não entram em contato com seus próprios sentimentos e são sempre levadas por padrões externos.
O corpo próprio seria aquele em que os movimentos são da pessoa, podem ter sido aprendidos de fora, moldados até certo ponto, mas foram “fagocitados”, autenticados. Compressão e tensão formaram movimento, dando dinamismo e flexibilidade.
Essas últimas são pessoas que se apropriam de sua vida, dão destino à própria existência, são conscientes de si e do mundo que as cerca e, fazendo parte do contexto, impactam e são impactadas por ele.
Coloco dois exemplos distintos, mas claramente falamos de níveis de intensidade, que podem variar, tanto de pessoa para pessoa, como na mesma pessoa.
Em momentos estamos mais disponíveis para ser atingidos por aquilo que vem do mundo, em outros momentos estamos menos disponíveis.
Entretanto, é importante estarmos conscientes dessas intensidades e quais são os nossos padrões de intensidade.
A psicoterapia pode ser um espaço de abertura para o começo da propriocepção, de uma conversa de outro tipo a respeito da vida e das escolhas que nela são feitas, um início para o caminho da apropriação.
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