Jogos Panamericanos
Geralmente me abstenho de falar muito de esportes. Como ex-atleta penso que, por vezes, posso ter meu olhar enviesado por uma prática de muitos anos, por uma história de paixão por esporte.
Apesar disso, muito estudei dentro da psicologia e sempre tive a terrível mania de olhar toda situação por diversos ângulos. Tenho uma natureza filosófica e, hoje admito, paciência.
Entretanto, ela muito me serve. Nos últimos dias tenho visto as notícias que saem sobre os Jogos Panamericanos (confesso que acompanho mais de perto a natação, dada a proximidade de vida).
Notícias sobre como nossos atletas nos decepcionaram. Essa frase é lida com frequência nos jornais e revistas, e, sinceramente, depois da raiva momentânea que me abate, olho para ela com certo humor.
Comecemos pela expressão “nossos atletas”, como se as pessoas que lá estivessem não fossem seres humanos. São nossas possessões, possessões de um país que nada faz por eles, que tem políticas completamente falidas no esporte e onde, com exceção do futebol, todos os outros esportes são subestimados.
A maioria dos “nossos atletas” mora fora do país para ter condições de treino que os alavanquem para competir em nível internacional.
Outro fato interessante é que aqueles que se dizem decepcionados são pessoas que nunca tiveram ligação com o esporte sobre o qual escrevem. Desconhecem o sacrifício de cada treinamento, as noites mal dormidas por conta de preocupações com detalhes e dores pelo corpo, a persistência de continuar, mesmo quando seria muito, mas muito mais fácil parar.
Segundo Hannah Arendt, a sociedade espera de cada um de seus membros um comportamento, impondo inúmeras e variadas regras, todas elas para fazer com que seus membros “se comportem”, abolindo a ação espontânea ou a reação inusitada, e quanto mais pessoas existem menor a possibilidade de que tolerem o não-comportamento.
Pois bem, infelizmente a “massa crítica” de nossa população, que teoricamente deveria levantar questões com o objetivo de produzir reflexão, reproduz a regra que tanto queremos eliminar: a ideia de que apenas o primeiro lugar serve.
Os gestos criativos de cada atleta que se coloca em situação e se arrisca, em sua maioria são desconsiderados. Em psicologia do esporte, por vezes tentamos trabalhar com o foco no desempenho, no atleta se desenvolver em relação a ele mesmo, ao seu próprio tempo, lançar-se em desafio para a auto-superação.
Nadamos contra a corrente tentando buscar a inteligência emocional em nossos atletas contra uma cultura imediatista. Poucos pensam que um ciclo olímpico tem a duração de quatro anos. Essa trilha não é feita apenas de estrada plana. Ao contrário, são caminhos sinuosos e cheios de buracos, e há de se cair algumas vezes para se aprender a pulá-los, contorná-los ou construir pontes.
Numa cultura brasileira em que tanto se tolera de nossos governantes, massacramos alguns de nossos representantes com fantasias infantis de super-heróis, desejando que o próximo Michael Phelps brote das águas de uma piscina brasileira como Iara surge das águas do rio.
Talvez possamos ser mais complacentes e pensar que todo potencial pode ser desenvolvido ou arruinado, e tudo depende de que caminhos escolhemos percorrer.
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