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“Serais cest possible alors?” ou as incoerências do mundo

Alguém mais se espanta com as incoerências do nosso mundo?

A cada dia que passa ouço mais e mais discursos sobre qualidade de vida, saúde, alimentação saudável, equilíbrio e por ai vai.

Entretanto, neste mesmo mundo em que o discurso acima é pregado, a obesidade foi considerada epidemia mundial pela OMS considerado o maior problema de saúde pública não reconhecido em nossa sociedade, doenças graves de autoimagem como anorexia, bulimia e a vigorexia nunca foram tão evidentes.

Do ideal esquálido da passarela ao mórbido sobrepeso, do oito ao oitenta, do nada ao tudo. Nossa pós-modernidade parece sempre viver os extremos. Em frenética compulsão por magreza ou por comida galgamos o caminho dos “sem freio”. Tal compulsividade pode ser reconhecida também nos toxicômanos e nos workaholics.

Convido o leitor a viajar no tempo, como no filme “Meia Noite em Paris” de Woody Allen, exceto que não vamos reviver os tempos da boemia, na tentativa de uma melhor compreensão destes fenômenos tão complexos.

Resumidamente vamos perpassar alguns movimentos importantes.

Desde Galileu, nós seres humanos, tentamos nos explicar no mundo. Afinal, o que nos diferencia de uma pedra ou de um macaco, é simplesmente que somos os únicos seres a indagar sobre nossa própria existência. A cada dia que se abre, com suas infinitas possibilidades, vemo-nos diante do enigma: “Quem sou? De onde vim? Para onde vou?”

Comecemos com a Idade Média, a idade das trevas, em que quase tudo era proibido, era pecado, a vida era extremamente restrita, as regras sociais extremamente rígidas, e o padrão de beleza era a mulher gordinha. No século quinze temos o renascimento, movimento de abertura social, houve uma quebra de paradigmas e valores caracterizada pela retomada dos valores clássicos. O homem passou a ser seu próprio objeto de estudo.

Começamos a explorar o próprio corpo humano anatomicamente, foi quando surgiram os primeiros estudos em relação à circulação sanguínea. Era mais uma tentativa de entender que lugar é esse que nós seres humanos, que eu homem/mulher, ocupamos neste mundo.

Em 1600 a matemática surge como primeira ciência a se desmembrar da filosofia.

O homem procura explicações lógicas e concretas. Nutre-se o solo para Descartes separar corpo e mente, criar o método cartesiano de pesquisa, orientada, fundada em fatores concretos e reais. Assim, o homem fica cada vez mais lançado ao mundo, tentando encontrar fora de si mesmo algo que o fundamente.

Nesta empreitada nossa sociedade criou valores e culturas, construímos seres humanos mais preocupados com aquilo que pareciam aos olhos dos outros do que preocupados com aquilo que realmente eram.

Criamos um boneco preso ao cotidiano e com um rombo. Incapazes do tempo da espera, intolerantes à frustração, consumindo tudo aquilo que se descortina em sua frente, sempre no atraso, como o coelho da história de Alice. Somos vorazes, como buracos negros, em busca de evitar a angústia.

Cada um com sua voracidade depositada em uma possibilidade, seja ela comida, drogas, trabalho, esporte ou qualquer outro modo de ser. Enquanto não nos depararmos com aquilo que é realmente de cada um de nós, enquanto não nos amigarmos com o nosso vazio, nunca perceberemos que talvez esse enorme fantasma que assombra a cada um de nós seja apenas uma sombra que pode oferecer seu frescor nos dias de calor.

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